A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado está prestes a analisar, na próxima quarta-feira (04), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que autoriza a venda de terrenos de marinha, áreas públicas pertencentes à União localizadas na beira da praia. Apelidada de “PEC das Praias”, a medida reacende debates sobre o impacto social da iniciativa, especialmente para comunidades empobrecidas que utilizam esses espaços para lazer e sobrevivência.
O que são os terrenos de marinha?
Essas áreas correspondem a uma faixa de terra que começa 33 metros além do ponto máximo que a maré alcança. Embora não incluam a faixa de areia e o mar — que continuam sendo públicos —, esses terrenos abrangem espaços adjacentes, muitas vezes ocupados por hotéis, bares e outros empreendimentos turísticos. Criada em 1831, ainda no período imperial, a regulamentação desses terrenos buscava proteger as áreas costeiras e garantir seu uso compartilhado.
O que muda com a PEC das praias?
Atualmente, os terrenos de marinha pertencem à União, que pode concedê-los para uso mediante pagamento de taxas específicas. A PEC propõe que esses lotes possam ser vendidos a empresas e pessoas que já ocupam a área, deixando de ser propriedade pública. Somente terrenos não ocupados e espaços destinados a serviços públicos, como portos e aeroportos, permaneceriam sob domínio do governo.
O relator da proposta, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), incluiu em seu parecer de julho a garantia de que o acesso às praias será mantido. O texto destaca que as praias continuarão sendo bens de uso comum do povo, com acesso “livre e franco”. Contudo, críticos argumentam que a privatização dos terrenos adjacentes pode dificultar o acesso indireto, principalmente para pessoas que não podem arcar com os custos associados a áreas privatizadas, como estacionamentos e serviços exclusivos.
Impacto social: quem perde com isso?
Embora a PEC insista que o acesso às praias será garantido, a privatização dos terrenos de marinha levanta preocupações sobre as consequências para populações vulneráveis. Para muitas famílias em situação de vulnerabilidade, as praias são um espaço acessível de lazer e sustento, com atividades como pesca e comércio informal. A privatização dessas áreas pode restringir as oportunidades de trabalho, aumentar a segregação e limitar o uso desses espaços por quem mais depende deles.
Além disso, a medida pode elevar o custo de serviços nas regiões costeiras, favorecendo empreendimentos privados de luxo em detrimento de comunidades locais. A proposta não menciona contrapartidas para preservar a acessibilidade econômica e social dessas áreas.
Por que a pressa na votação?
A tramitação da PEC havia sido suspensa em maio após ampla repercussão negativa. No entanto, a proposta voltou à pauta da CCJ, pegando de surpresa até mesmo o líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD-BA). O Planalto, por sua vez, já se posicionou contra a medida.
O futuro das praias e da população
Se aprovada pela CCJ, a PEC das Praias ainda precisará passar por duas votações no plenário do Senado antes de ser promulgada. A medida, caso avançada, pode representar um marco na relação entre o público e o privado no Brasil, levantando dúvidas sobre quem realmente terá acesso aos benefícios dessas áreas estratégicas.
Para as populações mais vulneráveis, a proposta representa mais um risco de exclusão e elitização dos espaços costeiros, comprometendo o direito ao lazer e ao uso sustentável das áreas públicas.